Friday, July 07, 2006

Uma noite em Nova York

A inquietação da solidão quebrava o silêncio da noite. Sozinha naquele enorme apartamento, sentia-se pequena e insignificante e desesperava por um diálogo que não o do silêncio. Do lado de fora das enormes vidraças a cidade pulsava a um ritmo acelerado. As luzes dos enormes arranha-céus rasgavam o horizonte e lá em baixo um autêntico corrupio vagueava por entre as ruas. Quase que dava para sentir o bater de Nova York e ela precisava disso mais que tudo mas ele não havia meio de aparecer. Preparou um martini enquanto esperava junto à lareira. Seco, ela gostava deles secos, apenas com uma azeitona e directo como um shot. Os minutos passavam e os pensamentos de inquietação e preocupação passavam agora a raiva. Não queria acreditar que ele tinha cumprido a promessa de não ir. Como era possível se ela tinha preparado aquela noite até ao último pormenor.

Decidiu sair, mas não sem antes trocar de roupa. No quarto de vestir tirou em segundos o bonito vestido que tinha e escolheu umas calças pretas, bem justas, coladas de tal maneira ao corpo que não usou nada por baixo para não ficar a marca. Para o conjunto estar completo escolheu um top preto, com alguns apliques prateados e sem costas apenas preso como por magia através de finíssimos fios que se atavam junto à cintura. Nos mamilos pôs adesivos para não se tornarem indiscretos e retocou o peito com a mesma base que lhe dava cor à face. Deu um ar rebelde ao cabelo e soltou um perfume fresco no seu pescoço, deixando escorrer por entre o peito até morrer suavemente na barriga meio desnudada.

Desceu no elevador ao som de Sting e chegada à portaria pediu um táxi. Ao entrar ainda olhou para trás numa leve esperança mas perante o vazio da rua entrou sem hesitar. “56th street na Village” pediu em tom seguro. O táxi arrancou imediatamente e o condutor, um paquistanês de turbante laranja e barba por fazer nem questionou o pedido. A 56th estava na moda, um novo bar lançava a tendência para a noite nova iorquina. Pelo caminho ainda teve tempo de passar pela Quinta Avenida e ver junto à Igreja o local onde pela primeira vez se beijaram. Virou a cara e preferiu ver as montras enquanto se lembrava de uma fantástica camisa que tinha visto em Central Park. Já na Broadway divertiu-se a olhar para os casais, que apaixonados começavam a noite. Lembrou-se do seu primeiro namorado e daquele beijo fantástico com a Estátua da Liberdade como testemunha. Finalmente o táxi parou. À porta uma fila enorme de pessoas amontoavam-se para conseguir entrar. Saiu sem grande preocupação, o cargo que ocupava tinha-lhe valido um cartão de cliente e em menos de um minuto a passadeira encarnada era pisada pelos seus finíssimos saltos de agulha.

Passado o detector de metais uma sala enorme se abre perante os seus olhos. O som está altíssimo com uma música de dança com batida de bateria e completada por um magnífico solo de saxofone em tons afro. O ambiente é fantástico, cheio de glamour e bom gosto. Numa primeira observação lança o olhar às roupas das adversárias da noite para o título de mais sexy da noite. Solta um sorriso quando repara que está no ponto e apenas uma miúda dos seus vinte anos com um corpo escultural a faz soltar um pouco de veneno, mas rapidamente se recompõe e se relembra que não se troca por nenhuma miúda de vinte anos. Avança para o bar passando ao lado da pista, onde a meia-luz corpos semi-suados dançam ao som da noite. Depois de alguns toques mais chegados consegue chegar ao bar onde um jeitoso barman, com uns ombros do outro mundo a recebe com um sorriso. “Um vodka, puro com pouco gelo”. A bebida é servida com novo sorriso e o gelo parece pouco para arrefecer o quente da noite. De copo na mão vira-se para a pista e por entre dois golos sente já o corpo a dançar. Decide fazer-se à pista e em segundos já está no meio a dançar de braços no ar, sentido o ar a entrar pelo top. A atmosfera está escaldante e os corpos tocam-se num bailado de sedução e erotismo. Saído do nada um moreno alto, de olhos azuis turquesa lança-se na sua frente. Está de t-shirt branca e umas jeans da moda. Nos pés uns ténis castanhos da Prada dão-lhe o toque de requinte que ele nem necessitava. Os olhares tocam-se e ao sabor dos tambores, que batem cada vez com mais força, os corpos começam a alinhar-se. Os movimentos são ritmados, marcando cada batida e cadenciando o toque das mãos. De forma atrevida, sente a mão dele passar-lhe pelo cabelo e não evita um sorriso. Bebe mais um pouco e aproveita para molhar os lábios num dos cubos de gelo já meio derretido mas suficientemente frio para lhe gelar o corpo. Sente um arrepio a percorre-la e mais fica quando de costas para ele sente o seu corpo de encontro ao seu.

Ao fim de duas horas de música, dança e sedução e de algumas vodkas vê-se animada a conversar ao sabor de um saboroso café e de um muffin. Repara agora que além de giro é interessante. Está perto dos trinta, claramente bem sucedido e bem resolvido com a vida. Independente, preocupa-se mais em ouvi-la do que em contar-lhe as suas histórias e toca-lhe, ela já tinha perdido a noção de como é bom ser tocada e ele fá-lo com delicadeza na sua mão e nas suas costas. O seu sorriso é lindo, e ele não o esconde a cada frase dela. A conversa prolonga-se sem manter a noção do tempo e só pára com o raiar do dia. Cansada decide regressar a casa e ele oferece-se para a acompanhar. Aceita e recebe também o seu casaco que lhe protege agora as costas de um pequeno vento matinal. Quinze minutos depois estão à porta de sua casa. É aquele momento horrível em que parece que a barriga gela e o cérebro pára bloqueando as palavras com sentido. Apetece-lhe beijá-lo mas não consegue deixar de pensar em como começou a noite e no homem pelo qual ainda sente amor. De sorriso aberto ele resolve-lhe o problema com um beijo na face e uma palavra delicada o que ainda a faz desejar mais um beijo. Resiste e toca-lhe apenas uma última vez no seu cabelo enquanto lhe devolve o casaco que ele agradece cheirando o seu perfume. Entra no elevador a sorrir e cansada tira os sapatos ainda na porta de entrada. Chega ao quarto despe-se devagar e nua sobre a cama dá uma última olhadela sobre a cidade e sussurra “thank you New York”.

4 Comments:

Blogger Marta Vinhais said...

Brilhante! Discreto, subtil, mas uma sedução perfeita.
Gostei muito.
Quanto ao abraço, fica também aqui um para ti.
Marta

13:44  
Blogger melga meiguinha said...

Muito obrigada pela sua visita.

Um beijinho.

15:41  
Blogger Pitucha said...

Nova Iorque, terra de todos os sonhos.
Beijos

07:42  
Blogger 125_azul said...

que prosa suave, com um toque de sex and the city... Beijinhos

23:01  

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